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Conselho Feminino: o outro lado da História

02/05/2025
Tomada de Posse do Conselho Feminino para o mandato 1960/1961, onde se pode ver Eliana Gersão e Carlos Candal a assinar o livro de atas.

Em 2023, numa edição comemorativa do Dia da Mulher, o Jornal A Cabra lança a sua célebre e marcante capa “Academia de Mulheres”. Nesta edição, salta à vista um artigo que recupera a história do Conselho Feminino.

 “A realidade é esta: elas estão aqui. Aqui e nas outras universidades. No entanto, ainda ninguém as viu…”, excerto publicado numa Via Latina de 1947 que afirmava a intenção da Direção Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC) de criar o Conselho Feminino (CF), uma estrutura que pretendia pensar os problemas “culturais e especificamente femininos”, bem como, dinamizar atividades “mais apropriadas e do interesse do público feminino”. 

Mas qual foi o rumo dado a esta Conselho? 

Manuela Cruzeiro, investigadora do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, afirma que inicialmente o órgão era pouco valorizado, não passava de “um grupo de jovens destinadas à missão de mães, esposas, fadas do lar”, dedicadas a dinamizar atividades de culinária ou costura.  Não obstantes os esforços de futuras direções do CF, as mulheres só começaram a entrar verdadeiramente no ambiente académico nos anos 50, afirma Manuela Cruzeiro. Com a vitória de Carlos Candal à Direção Geral da AAC, numa lista de esquerda em representação do Conselho das Repúblicas, o CF também sentiu a mudança. Implementaram novas atividades, incluindo “sessões de educação sexual disfarçadas”. Ora, estes novos ares foram percecionados com grande descontentamento pelos setores mais conservadores e o CF foi acusado, pelas jovens mais conservadoras, de não representar todas as raparigas. A este descontentamento seguiram-se meses “verdadeiramente infernais”, refere Eliana Gersão. Foram feitos inúmeros ataques a raparigas, nomeadamente panfletos anónimos que insinuavam supostas “imoralidades”. O ambiente era caótico, mas acalmou. A 19 de abril de 1961 é publicada na Via Latina a “Carta a uma jovem portuguesa”, que Isabel de Alarcão diz ter sido “uma pedrada no charco”. A Carta em defesa do amor livre, que denunciava as desigualdades de género vigentes, foi, para Eliana Gersão, “inoportuna” e considera que o facto da censura ter autorizado tal publicação foi “uma armadilha para fragilizar todo o movimento associativo”. 

Com o aumento da representatividade feminina dentro de outras estruturas  da AAC, o órgão, já fragmentado, vai perdendo preponderância e acaba por desaparecer. Eliana Gersão, num artigo da Via Latina, afirma que o desaparecimento do CF “não significa que os seus interesses foram esquecidos, significa que [a estudante] tomou finalmente consciência do papel que lhe pertence dentro da AAC.”

É facto que as mulheres começaram a ocupar cargos dentro das diferentes estruturas da Casa, mas não deixaram nunca morrer a sua luta: de Grupo da Mulher a Secção da Mulher da AAC, o seu papel dentro da Associação Académica não deixou de ser assunto.

E atualmente? Que papel é que “lhe pertence dentro da AAC”? 

É certo que há, ainda, um longo caminho a percorrer. Recentemente, foi criada uma Comissão Independente para a Igualdade de Género, com o intuito de debater livremente questões de igualdade de género, bem como, criar um espaço seguro para denunciar situações de desigualdade. 

77 anos depois, elas continuam aqui, pelos corredores do edifício e não só. Mas será já uma verdadeira “Academia de Mulheres?”.

Artigo originalmente escrito por Disa Palma, Ana Raquel Cardoso e Lena Hertel.

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